QUALIDADE DE VIDA

A Super Mulher sofre com excesso de responsabilidade e culpa

O Dia Internacional da Mulher é comemorado em 8 de março. Vale lembrar que a data celebra o resultado de reivindicações e lutas das mulheres por melhores condições de trabalho e por igualdade de direitos entre os sexos, em termos sociais e políticos. O objetivo desse dia especial é discutir o papel da mulher na sociedade atual, identificando discriminações e violências morais, físicas e sexuais que ela ainda sofre. Diversos movimentos femininos conquistaram grandes avanços ao longo do século XX. No entanto, o problema da violência permanece grave, é global e atinge todas as camadas sociais. Em relação à igualdade de direitos, há diferenças que precisam ser esclarecidas. Nem sempre mulheres e homens são beneficiados com as mesmas oportunidades no campo do trabalho e dos salários, no acesso à vida política, no equilíbrio entre realização profissional e pessoal. É evidente que a mulher contemporânea ampliou seu espaço social, acumulando funções tradicionalmente delegadas aos homens. Ultimamente, milhões de lares brasileiros têm uma mulher como chefe de família. Além do papel de provedoras, muitas se empenham no desenvolvimento da carreira, assumindo uma carga de trabalho e responsabilidade cada vez maior. Conhecemos profissionais bem-sucedidas que enfrentam um cotidiano imensamente estressante, ao qual dedicam toda reserva de energia. Hoje em dia, uma característica importante das mulheres é assumir diferentes papeis. Elas são mães, esposas, profissionais e cidadãs. Esta forma de emancipação impõe pressões inerentes às várias funções desempenhadas. A estas pressões acrescentam-se outras, tais como os apelos da indústria de beleza e da publicidade, modeladores de padrões estéticos distantes da realidade. A maioria se sente convocada a ser linda e magra, elegante e eficiente, sensual e poderosa! Diante de tantos fatores de sobrecarga emocional, a nossa “supermulher” vive estressada, sofre com excesso de responsabilidade e culpa.

Frequentemente, responsabilidade e culpa se confundem. Quase sempre, essa confusão acontece porque aprendemos a sentir vergonha por ter feito algo errado. Dessa maneira, deslizes e descuidos, enganações, discórdias, prejuízos e erros são internalizados como inferioridade e inadequação pessoal. Nesse enfoque, a culpa distorce a auto percepção e provoca desilusão consigo mesmo. Esse sentimento, descrito como um peso na consciência, resulta de um comportamento ineficaz. Assim, diante de promessas não cumpridas na vida doméstica ou de compromissos negligenciados no trabalho, mulheres multifuncionais acumulam a sensação de estar em dívida consigo mesmas e com os outros. E elas se cobram bastante: cuidados, competências, perfeição! Se a culpa pesa e paralisa as boas trocas afetivas, a responsabilidade abre perspectivas de reparação. Reponsabilidade, neste caso, implica criar condições para administrar os próprios limites, reconhecendo pontos fracos no modo de agir, identificando impossibilidades e desajustes, assumindo as oportunidades de reparação. Esta reparação é ativa: promove o reconhecimento de condutas impróprias e a correção dos efeitos negativos, faz o ajuste das expectativas e aprimora atitudes positivas. A supermulher do século XXI culpa-se por não conseguir fazer tudo conforme planeja ou como gostaria. E sofre por não ter controle das situações. Se o apelo cultural é para ser uma heroína incansável e vitoriosa, a realidade impõe encarar com bom senso as infindáveis obrigações, de modo a tratar a vida doméstica e a vida pública segundo as possibilidades individuais e as contingências socioambientais. Ser responsável pode ser angustiante, implica escolhas e decisões diante de desejos e ambições, impedimentos e frustrações. Num mundo de tantas pressões, é importante aprender a buscar o possível dentro do que parece impossível. O estresse, a ansiedade e a depressão talvez sinalizem que o heroísmo individual não é o caminho para quem tem vocação para feminizar o mundo.

Marisa Moura Verdade é Mestra em Educação Ambiental, Doutora em Psicologia, especializada em Psico-Oncologia. Autora do livro Ecologia Mental da Morte. A troca simbólica da alma com a morte. (Editora Casa do Psicólogo & FAPESP). E-mail: mmverdade@gmail.com